terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Feliz por nada

Meus dias agora eram assim. As minhas preocupações beiravam o ridículo. Eu tinha que estar atenta se a minha cadeira estava bem posicionada sob o sol ou se a cerveja estava gelada o bastante para acompanhar as lindas tardes do Nordeste. Me preocupava se a foto havia saído boa ou se aquela mensagem que eu tanto esperava de você já havia chegado. Sim, porque tinha você. Do nada. Como parte do pacote de verão deste ano, pra me trazer mais sorrisos e um bocado de saudade, diga-se de passagem. E minhas tardes se sucediam com muita paz, tranquilidade e um tanto de ansiedade pra receber qualquer sinal de fumaça seu. E você se encaixava perfeitamente no que eu agora escolhia como parte de minha felicidade. Estar feliz pelo simples motivo de motivo nenhum.
Martha Medeiros, autora do livro cujo nome é o título desse texto disse bem: 

"Particularmente, gosto de quem tem compromisso com a alegria".

E eu tinha todo o compromisso do mundo agora. Com hora marcada, contrato assinado e reuniões diárias com o sorriso mais sincero que existia em mim.

sábado, 17 de dezembro de 2011

Novo

Em nome de toda a felicidade, de todo o sorriso que meu rosto estampava agora e das chuvas de verão que tentavam refrescar o Rio, eu aplaudia a vida de pé. Era bom sentir de novo a sintonia. O fluir dos dias na mais perfeita paz e satisfação pelo quanto a vida tinha me acrescentado nesse ano tão atípico. E eu me sentia seguindo à risca o tal clichê "ano novo, vida nova" porque, de fato, me deixava invadir pelo ar de renovação.
E, se você ainda me lê, saiba e lembre que eu devo a você metade de todo o choro e todo o riso desses dias. E que não te falte nunca dias bons e produtivos. Nem carinho. Nem sorriso. Até dor, bem de levinho. Porque não há prazer nesse mundo que se sustente sem a dor.

Dá saudade em mim, confesso. Dói um pouco a sua ausência. Mas é impossível estar vazia com a vida se ajeitando.
Nenhum amor pode ser maior que o amor próprio.
E esse, agora, aflora como eu nunca assisti antes.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Apesar de você

"Apesar de você...", eu seguia dizendo. E parava a frase sempre no mesmo ponto. No início, quando eu tentava completá-la, não fazia sentido algum. Algo como: " Apesar de você, a felicidade foi embora". " Apesar de você, a saudade tem me arranhado o peito". Simplesmente, a tristeza não me deixava pensar. Não permitia coerência da fala. Não me deixava olhar pra frente, nem pra cima. Era só chão e chão. E quando eu conseguia voltar os olhos lá pro céu, via era chuva em dia de sol.
Até que um dia, a chuva deu uma trégua. No outro dia, nem sequer apareceu. E dias e dias se seguiram. Eu parei de reclamar. E outros sorrisos viram, então, terreno fértil pra se aproximar. Outros rostos, outras vozes. "Apesar de você, a vida segue", falei como que por impulso. "Apesar de você, eu ainda rio sem motivo".

Veja bem, o amor não foi embora. Ele só muda de cara, e se adapta a cada par que chega de mansinho pra adoçar a nossa vida. Nunca fomos um do outro. Vida e corpo, sempre nossos. As pessoas vão embora. O amor fica inteirinho. Prova disso é a saudade que aperta e torce a garganta. Mas tem nada não. Sem amor, não vale a pena. E quando dói demais, alguém dentro de mim fala ou canta novamente:

"Apesar de você, amanhã há de ser outro dia"

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Sob medida

De novo, voltava na mesma ideia: no dia em que resolvesse parar de esperar dos outros e da vida, talvez ela conseguisse exatamente o que precisava. Seu problema estava sempre no excesso de expectativas. Esperava sol no domingo, esperava flores naquela data importante, esperava chuva do céu cinza e esperava colher tudo o que plantava. O estranho é que as vezes colhia uns espinhos em vez das flores que tanto queria. Esperava o amor e tomava era uns socos. Esperava calor e morria de frio. Esperava alcançar a linha de chegada e ficava sempre por um triz. Não entendia como a vida podia não dar a ela os frutos inteiros do seu esforço. Talvez se cobrasse demais, era o que diziam. Talvez duvidasse demais, diziam também. E ela se afogava no seu próprio oceano de cobrança. Quanto maior a expectativa, maior seria o tombo.

E no dia em que resolvesse viver o presente em vez do futuro (que, por sinal, ainda não existe), aí sim talvez a vida viesse feita sob medida pra ela. 

sábado, 19 de novembro de 2011


"A única preocupação será, então, o cuidado pra não cair na rotina", dizia ela, firme e decidida.
Queria mesmo sentir na pele a imprevisibilidade da vida. Andar por aí sem esperar nada, deixando-se surpreender como uma criança que arregala os olhos quando vê uma lagarta listrada. Deixar por conta do vento o estilo do cabelo. Sair de casa entregue ao dia e ao seu estranho itinerário em tempo real. Não traçar no papel o caminho a ser feito, mas confiar que de alguma forma ele vai se fazendo.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

E você tentava falar, e não saía nada. Falava, falava. E não falava nada. Se no outro dia você havia falado demais, agora o que imperava era o silêncio, alguma culpa e muita fuga. Me pego pensando, às vezes, que diabos eu estava achando que você poderia me dar. Nós, dois túmulos fechados sem o menor traquejo em expressão. Mas o problema não era bem esse. Se usássemos sinais, escrita, códigos, o que fosse, ainda assim não nos entenderíamos. Você havia falado um mundo naquele dia e, agora, não sabia o que fazer com o que havia criado. Só sabia fugir e se afastar da responsabilidade. Colocando no meio uns traumas passados pra dar aquela caprichada. Enquanto eu, quieta no meu canto, observava a cena sem acreditar. Talvez risse um pouco, dentro de mim. Ria da minha falta de experiência. Pois eu agia como menina ao confiar em você, achando bobamente que a regra de só confiar em si mesmo mudaria por acaso nessa vida de armadilhas. 
Então tá. Amanhã logo passa e eu sigo de novo com meu pé atras.
Já você seguiria com o peso da imaturidade, do medo de mergulhar e com aquela cobrança excessiva da qual tinha me falado, que talvez acabasse se você prometesse um pouco menos.

Ou, então, seguiria sem peso nenhum. Nem sei mais o que se passa na sua cabeça. Vai ver não passa nada.
Abro mão de pesquisar.

domingo, 23 de outubro de 2011

Dois cafés e a conta

Era engraçado ver como o tempo havia passado. Por fora, você havia mudado. Por dentro, eu nunca saberia. Já de mim, eu falava das mudanças interiores. Enquanto por fora, era ainda igualzinha. Tudo bem, ainda era tímida e desajeitada. Pois se não ficasse vermelha (roxa, azul, quem sabe) e não deixasse cair o café um pouquinho que fosse, definitivamente não seria eu. E falávamos da vida. Da vida de agora e alguns flashes da de antes. E eu ria. E te fazia rir com as coisas mais bobas que fossem. Andaria pelas ruas do Leblon quanto tempo quisesse. Porque o tempo, na verdade, nunca andava no seu ritmo normal quando eu estava com você. Saía correndo tresloucado, como se tivesse raiva da nossa descontração. E era assim. Em algumas horas era impossível eu te contar todos os detalhes do que eu pensava agora.
Todo mundo espera muito de sábado à noite. E eu não esperava muito mais do que um bom papo como aquele. 
Mas, se tivéssemos tempo pra uma cerveja, eu faria um brinde.
A você, todo o meu carinho.
E a mim, mais doses de maturidade como as que a vida vinha me oferecendo.

domingo, 16 de outubro de 2011

Esconderijo

Eu não queria voltar por nada. A chuva de São Paulo, os cimentos de São Paulo e o movimento de São Paulo nunca foram tão acolhedores, tão o meu lugar. Aí eu penso direito e vejo que o meu lugar, atualmente, poderia ser também Guaporé, Timbaúba, Conchinchina ou Paris. Qualquer lugar que não fosse minha casa, e que não tivesse os trejeitos da cobrança. Eu poderia ficar aqui, tranquilamente, existindo. Invisível, longe desse mundo um pouquinho que fosse. Talvez só sobrasse meu interior para estar à vontade. E aí eu vejo que nem aqui dentro eu vou dormir tranquila. Definitivamente, meu corpo não era o melhor lugar para estar agora.

No fim das contas eu não estou em lugar nenhum. Me escondi por aí e não faço a menor ideia de onde eu possa estar andando.

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Relicário



E se há algum vínculo, eu vou lutar por ele. Vou querer saber de você, da sua vida. E quando te vir passando, ainda vou sentir o frio na barriga. Não é porque o amor foi embora que nós, enquanto carinho e bem querer, temos que ir também. Aquela tênue ligação, frágil como a linha de um telefone sem fio, vai ser protegida por mim todas as vezes que eu sentir a sua voz indo pra longe. Me falta ar toda vez que penso na memória indo embora. Não deixe que vá.
Eu e você somos duas lembranças que o tempo não há de tocar. 

domingo, 25 de setembro de 2011

Corrida

Eu costumava pensar que tudo na vida que mexe muito com a gente precisa de um tempo pra ir embora. Não é mágica, não é piscar os olhos e nem acordar no dia seguinte pra nos vermos livres dos pensamentos. 
A questão é, então, por quanto tempo trabalharemos pra ir tirando aos poucos aquilo de dentro de nós. Dose homeopática, eu sei. De pouquinho em pouquinho. Que nem criança pra tirar um curativo...não consegue puxar tudo de uma vez só. Ainda que tenha que sentir cada pontadinha de dor espaçadamente. Pois bem...eu estava indo aos poucos. Permitindo que minha cabeça e coração tomassem seu tempo.
Acontece que um dia cansamos.
Nos vemos suspirando por aquilo que um dia era a razão de nossa disposição.

Simplesmente, então, abrimos mão. Paramos de correr. E sentamos no meio-fio. 
E pela primeira vez não há choro.
Nó na garganta.
Nem nada.

É algo parecido com quando vamos pegar um ônibus parado no ponto à distância. Ele acelera, sem esperar. Então corremos atrás. E corremos. E corremos. E corremos...
Até que, um hora, simplesmente paramos. Voltamos pro ponto e esperamos o próximo.

Acho que me sinto assim agora.
Parando de correr.
E, incrivelmente, sem a sensação de derrota. 
Eu pensava que toda desistência era sinal de derrota.

Dessa vez não...
Eu estava serena.
Com a tranquilidade que tanto havia procurado.
E justamente quando paro de procurar por ela, ela vem cair na minha mão. Me alisar o cabelo. Enxugar o suor. E me abraça forte, finalmente dizendo baixinho:

"Tudo bem, meu bem."

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

E aí você entende que ainda tem suas próprias pernas. Não está impossibilitado de caminhar sozinho nem doou sua autonomia pra ninguém. Lembra de se colocar de novo em prioridade, de onde nunca deveria ter saído. Lembra também que as dores não são eternas...e, no fim das contas, por trás de todo o drama e choro, você ainda sabe andar sozinho. Tá, talvez falte alguns pedaços, talvez seja um esforço descomunal. Talvez, no início, seja só mecânica mesmo essa coisa de seguir em frente. Mas funciona. De algum jeito vai. 
De algum modo você entende (duvidando muito, mas entende) que o coração não parou e você ainda é dono de si próprio.
Nessa hora é que a vida se sente segura, finalmente, pra mostrar as surpresas que ainda guarda pela frente. 
E dá seguimento ao seu processo de cura.

Te provando, mais uma vez (porque você teima em esquecer), que nada que aconteça com você vai, um dia, conseguir ser maior que a imprevisibilidade da vida e a sua admirável capacidade de auto-renovação.

sábado, 10 de setembro de 2011

Calmaria

Deitada num deck da Lagoa Rodrigo de Freitas, eu contemplava minha vida esparramada na madeira do meu lado. Cada passo dado por quem chegava pra observar a vista estalava nos meus ouvidos. Do meu outro lado, alguém sentado num long também curtia a serenidade daquele lugar. Um time de remo cavava as águas ao longe e em alta velocidade. Uma criança se aproximava da ponta do deck e, correndo logo atrás, vinha a mãe em desespero, segurando a bola, o carrinho e deixando cair a pipoca. Um casal passava em um pedalinho. Uma família tirava fotos. O cristo se encobria por neblina, provavelmente frustrando os turistas e suas máquinas. O mormaço da manhã aquecia meu rosto. E minha respiração acompanhava a oscilação da plataforma.

O mundo inteiro acontecia.
E eu, deitada sobre o Rio de Janeiro, não ousava emitir nenhum ruído, pra deixar a vida repousando como estava. Os ruídos de fora não atingiam o silêncio da minha mente.

Um vendedor se aproximou. Vendia quebra-cabeças de raciocínio constituídos por umas pecinhas de metal, presas umas às outras.
- Moço, deixe primeiro eu resolver o problema aqui da minha cabeça, que depois compro outros pra me ocupar.
- Mas esses estão num preço ótimo. Faço desconto.
- Tenha certeza de que o preço não é a questão. Esses aqui da minha cabeça têm me custado caro demais, e ainda assim eu tento resolver.

Ele riu. E saiu.

A sintonia com o lugar continuava. Minha vida não acordava por nada.
Talvez quisesse mesmo esse tempinho de paz, cansada que estava.
E eu poderia ficar ali deitada.
Até que finalmente começasse a fluir.

terça-feira, 30 de agosto de 2011

Para um breve talento

Eu seguia tranquila, sabendo que o coração já estava em outra direção há tempos. Agora apenas confirmaria. Seguiria firme, corajoso e sem receio pra buscar o novo, pelo qual já pedia há tempos. 

Colocando o tênis e já com a mochila nas costas, pronta pra sair de uma vez por todas, eu olhava uma última vez pra trás. E lamentava, de certa forma, não o fim das coisas, pois tudo na vida vira pó. Mas o potencial do que tínhamos, comparando ao fim que levou. Que nem aqueles artistas que deslumbram o mundo com sua voz e de repente vão embora, de um dia pro outro, carregando nos seus 20 e poucos anos toda a intensidade de uma vida passageira.

No fim, depois de muito discutirmos pra ver quem ganhava o troféu (ou razão, como queiram), eu soltei a corda. Deixei você seguir com o que quer que você quisesse nas mãos. Que nem criança quando chora muito, damos um brinquedo qualquer, ou alguma coisa que ela esteja fitando, e pronto, temos paz e silêncio. 
Junto com o troféu do qual você tanto fazia questão, levou também uma coisa pela qual eu não lutei. E, infelizmente, você não conseguiu descarregar por aí, em qualquer esquina. O peso na consciência. Esse, só de não levar pra casa (ou vida, como queiram), eu já estava realizada. 

Talvez pertencesse mesmo a você. E não se encaixasse em nenhuma estante (ou cabeça, como queiram) que não fosse a sua.

Uma pena, eu dizia pra mim mesma. Segura por confirmar, mais uma vez, que confiança é algo raro. E não se acha por aí. E finalmente, quando eu cansei de procurar em você, você me provou que não existia.
Eu diria que você apressou a nossa morte como um artista às vezes apressa a vida nas drogas. Mas ele se eterniza. E nós não.

Depois do fluxo de consciência, eu fui embora. Seguir a luz que a vida me acendia. Porque sempre acende.
E você pensando que iria conseguir apagar todas.

Tudo bem. Conseguiu.
Mas não foi na minha vida.



sábado, 27 de agosto de 2011

                                                                                                                                                             
"Se o homem não sabe a que porto se dirige,
nenhum vento lhe será favorável."
(Lúcio Anneo) 

Não, não há como continuar andando sem ter algo pra alcançar. Meta, objetivo, ideal, como queira chamar, é o que move o indivíduo mais cansado pra frente; é o que faz com que as pernas, que parecem não mais aguentar o peso do corpo, continuem andando, quase como um milagre.
Você não precisa começar do grande para estipular metas. É difícil, pede tempo e paciência. Pede força de vontade e tudo aquilo que te faz vasculhar o seu interior, de cima a baixo, fazendo-o duvidar de que o que você procura pode realmente estar dentro de você. 

Comece pelo simples, então. Que nem naquelas horas nas quais você se incomoda com o sedentarismo, respira fundo e toma a difícil decisão de que aquele é, finalmente, o dia de dar uma corrida na praia. Então...as metas precisam sair pra correr com você, ou nada feito. Elas aparecem, assim, da forma mais simples possível, mas não menos desafiadora. Algo como: " não paro até chegar naquele posto" , ou "só depois do prédio vermelho pra poder beber água". E assim vai. Pontos demarcados no seu trajeto e você não para até que passe por eles. O corpo grita de cansaço, só que o seu objetivo vai além desses detalhes.

Quando pequena, pra recortar uma folha de papel, eu gostava de fazer um risquinho no fim da linha imaginária que minha tesoura percorreria. Então, assim que começasse, não podia olhar pra mão, nem pra tesoura, nem pra nada que não fosse aquele risquinho parado ali, marcando a linha de chegada, esperando pra ser atingido. A linha saía. E com os errinhos mais tênues que você pode imaginar. Uma curvinha aqui, outra ali, mas nunca uma interrupção. Era meu objetivo o risquinho lá parado, e eu não sossegaria a mão antes de alcançá-lo.

Acredito que a vida tem dessas coisas também. Uns pontinhos que significam as suas conquistas pessoais. Não importa o que seja. Terminar um livro, ganhar uma corrida, acertar o gol, zerar o videogame, fazer alguém parar de chorar ou até se tornar um grande médico. Qualquer objetivo é válido desde que faça você caminhar. 

E não vale parar até passar daquele poste.





sábado, 20 de agosto de 2011

Eu, você e a chuva. De vez em quando eu deixava meu ombro molhar só pro guarda-chuva te proteger por inteiro. Pegava no seu braço e te trazia pra perto. E andávamos com pressa e em silêncio. O silêncio ganharia de nós em conteúdo se tentássemos abrir a boca. Finalmente, quando cheguei em casa, deixei você se acomodar. Água, bolo e demais cerimoniazinhas de praxe até eu lembrar que a casa sempre foi sua. Sentei na sua frente. E começamos a falar, sufocados pelo peso do ambiente. Eu procurava no seu rosto, desesperadamente, alguma coisa que fizesse, em 2 segundos, todo o nosso sonho voltar pra gente de novo. Mas não voltaria. Dali em diante eu teria que ser forte. Minhas lágrimas vieram antes. As suas apareceram depois. Mas no fundo competíamos, de igual para igual, pra ver que coração estava correndo mais risco de vida. Eu tinha, em mim, uma caixinha com motivos pra pensar que o sentimento nunca foi o dono de toda a verdade, de toda a festa. E dessa vez ele havia me deixado na mão. Eu queria proteger você por inteiro dessa dor que toma o peito e a garganta, que deixa o olho vermelho e embaça a vista a cada minuto. Mas eu não poderia. Precisava, primeiro, era cuidar de mim. E dizer pra você o que a vozinha de dentro de mim sempre me diz: "olhe, vai passar. Sempre passa."

quinta-feira, 18 de agosto de 2011



"...Tudo isso dói.Mas eu sei que passa, que se está sendo assim é porque deve ser assim, e virá outro ciclo, depois.Para me dar força, escrevi no espelho do meu quarto: "Tá certo que o sonho acabou, mas também não precisa virar pesadelo, não é?" È o que estou tentando vivenciar.
Certo, muitas ilusões dançaram - mas eu me recuso a descrer absolutamente de tudo... Também não quero dramatizar e fazer dos problemas reais monstros insolúveis, becos-sem-saída.Nada é muito terrível. Só viver,não é? A barra mesmo é ter que estar vivo e ter que desdobrar, batalhar um jeito qualquer de ficar numa boa. O meu tem sido olhar pra dentro, devagar, ter muito cuidado com cada palavra, com cada movimento, com cada coisa que me ligue ao de fora. Até que os dois ritmos naturalmente se encaixem outra vez e passem a fluir.Porque não estou fluindo".

(Caio Fernando Abreu)

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Amor-coragem

Primeiro o amor vem como um mar de felicidade. Uma sensação inexplicável de disposição e vontade. Vem também no corpo de uma ansiedade boa, constantemente impulsionando para o encontro e para as conversas demoradas ao telefone. Amor chega e domina, já mostrando quem é que manda agora que você foi atingido por um dos mais gostosos estados da mente e do corpo humano.

Acontece que o amor também cega de primeira. Cega você pros eventos paralelos que acontecem enquanto se ama, de modo que nada nem ninguém consegue ter a dimensão que tinha antes, quando você enxergava. Tudo é tão pequeno pra quem agora pensa tão grande...

Mas então, chega uma hora em que sua visão começa a ser recuperada lentamente. Não porque o amor acabou, mas porque está passando pra uma outra fase, não menos gostosa de se viver, mas bem diferente da primeira.
Nesse momento, você passa a enxergar aquela cicatriz no supercílio, que não via antes. Passa a detestar a ironia da pessoa de vez em quando ao falar, e isso você também não via antes. O jeito de comer às vezes incomoda, a lentidão pra se arrumar, o gosto para filmes e alguma vezes você se magoa com grosserias e discussões que sempre se iniciam do menor problema que existir no dia.

Nessa hora, o amor toma sua forma mais madura. Em vez de cegueira e conforto puros, o amor também toma a face da coragem. E passa a significar um constante processo de recuperação. Não algo como aquelas massagens cardíacas de reanimação nos últimos minutos do segundo tempo. Não é desespero, nem desgaste pra quem vive esse amor-coragem.

É a força de vontade pra entender que o amor, acima do conforto pleno, é comemorar vitória juntos nas quedas que a vida resguarda por aí. Dar as mãos apesar dos defeitos. 
E abrir um sorriso no rosto, de novo, depois de uma longa noite de choro.

sábado, 6 de agosto de 2011

De volta

Fisicamente havia voltado. Mas a cabeça ainda não havia se ajustado completamente. Não tinha facilidade de se apegar a pessoas, a momentos e, muito menos, a lugares. Mas o outro continente a havia encantado. Talvez estivesse mesmo precisando de novos ares. Ver nova gente. Forçar o cérebro a bagunçar o ritmo do sono. 
Foi pra lá e voltou apegada. A pessoas, momentos e lugares.
Mas era isso. Sua casa não era lá, seu estudo também não, nem sua vaga do carro e nem o lugar onde tomava café.
Sentada na cadeira, de frente para a imagem projetada de um encéfalo. O caderno e a caneta em mãos. A sala lotada, um murmurinho no canto esquerdo e a cabeça fora de órbita. 
"Algumas subdivisões hipotalâmicas estão envolvidas com o controle do ciclo sono/vigília". 
Sono, vigília. Sono, vigília. Sono, vigília.

E essa seria sua rotina até que conseguisse voltar completamente.

sexta-feira, 15 de julho de 2011

O que ainda vive

Todo dia me pergunto que sensação é essa que vem quando alguma coisa chega ao fim. Por que a cabeça não pode estar logo ansiosa pelo que vem pela frente e, em vez disso, fica um tantinho presa àquilo que já foi embora? Penso que, talvez, as coisas quando não são vividas com 100% de aproveitamento ganham um lugar na memória e te alfinetam sempre com a lembrança. 
Mas então lembrei que quando vivemos com o máximo de vigor que pode existir dentro de nós, também há essa sensaçãozinha. Um nó na garganta. Uma mini agonia porque algo chegou ao fim.

O que não entendemos é que sempre caímos nessa mesma armadilha. De que as coisas terminam na semana 1, fulano foi embora no dia 4 e a viagem acabou no mês 5. Na verdade, não temos o real conhecimento sobre o tempo das coisas. Não é você quem dita as regras do relógio. É por isso que aquilo que pra nós é a saudade, na verdade, na verdade, é só um modo de as coisas da vida continuarem vivas. Uma maneira de a vida andar no seu ritmo. Te provocando como bem quer. Sempre mutante...existe um pouquinho em experiências, seguindo o mesmo tempo que você. Deixando seu corpo ser cobaia dos acontecimentos. E depois, a vida encarna na memória. Vira um filme, um espetáculo. E você ainda chama de saudade...é a mesma fase ali vivinha. Só vestida de outro jeito. Você não perdeu nenhum detalhe.

Garanto que você já fechou os olhos pra uma dessas lembranças. E sentiu, novamente, o corpo participando daquilo que passou. Dando sinais de leve, às vezes, com lágrima, com sorriso de canto de boca ou até com riso alto que chama olhares pra você. É nessa hora que o corpo brinca, te trazendo confusão acerca do limite, nunca muito bem esclarecido pra mim, entre o sonho e a experiência em si.

segunda-feira, 4 de julho de 2011



"A única coisa mais inconcebível do que ir embora era ficar; a única coisa mais impossível do que ficar era ir embora. Eu não queria destruir nada nem ninguém. Só queria sair de fininho pela porta dos fundos, sem causar alvoroço nem conseqüências, e depois só parar de correr quando chegasse à Groenlândia."

(Comer, rezar, amar)

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Pela vida

Hoje eu quis dormir até tarde, "perder" a manhã, como dizem por aí.  Quis pegar a bicicleta e deixar nas mãos do vento o estilo do cabelo. Quis sair de chinelo no frio, tomar sorvete no frio, mergulhar no mar no frio. Comer chocolate sem peso na consciência. Deixar o ônibus passar e seguir a pé. Hoje quis rir alto de um livro. Rir alto de nada. Quis desligar o celular e ponto final. E que mandem cartas se quiserem entrar em contato. Quis chorar com o filme no cinema, ou rir alto pela 3ª vez consecutiva. Hoje quis trocar a luz da luminária do quarto pela luz do sol lá fora. Quis ouvir música nas alturas. Quis ficar de bem com a bagunça do meu quarto, vendo que cada objeto não poderia estar em um lugar melhor que aquele. E se perdi o nascer do sol, quis assistir sua despedida, aplaudir sozinha e respirar com força os últimos raios da tarde, como um carpe diem de minutos por não saber se a tarde iria aparecer de novo. Quis assistir o show de cores do céu. Azul claro...laranja...azul escuro...preto. E quando chegou a noite, quis curtir o frio, tomar vinho com fondue num aconchego só meu. E me senti romântica, como se tivesse motivos e destinatário pra isso. Amor pela vida, quem sabe.

Hoje quis deixar o peso num cantinho. E sentir que a vida é leve. Muito mais do que se pensa por aí.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Flash

Depois de tantas brigas, depois de tanto choro, tanto grito e tanta despedida sem razão, ela se deitou na cama pra mirar o teto. O silêncio da casa dormida parecia convidá-la para assistir os filmes que se passavam na sua cabeça. Ela se cobriu até a rosto. Como quem se esconde do perigo iminente. Que perigo? Não sabia. Vivia assim, em um estado de alerta contínuo que muitas vezes eram fruto dos alarmes falsos que sua cabeça criava. Descobriu-se. O frio logo veio banhar o rosto. Olhou para o lado, querendo achar o sono, e achou, no lugar, uma máquina fotográfica. Um poço de lembranças digitalizadas no qual ela ousou mergulhar naquele momento. 
No entanto,  para a sua surpresa, nenhuma foto que olhava havia ficado boa. Todas embaçadas. Ofuscadas por qualquer defeito que fosse daquele aparelho de qualidade mediana. Tinham tudo pra ser lindas, as fotos daquela fase. Tinham tudo pra deslumbrar os olhos de quem visse e encher o orgulho do fotógrafo. Mas não. O foco havia sumido. A nitidez nem dava sinal de ter passado por ali.
Ela refletiu, então, sobre o que podia ter dado errado nos flashes da melhor fase de sua vida. 
Logo viu quem ofuscava. Logo viu quem tirava o foco dos momentos em que a felicidade reluzia de tão nítida! 
Era o medo.
Ele embaçou os melhores momentos da vida da menina porque a impediu de cair de cabeça. Embaçou os sorrisos, os abraços, os beijos e as certezas daqueles dias. Por causa do medo, muita coisa não havia sido vivida com clareza, com nitidez; degustando cada detalhe da paisagem oferecida.

Depois da conclusão, outro pensamento veio bater à porta. 
"Se o medo é a limitação da vez, começo a vencê-lo agora. Que venham dias intensos e sorrisos na forma mais pura que a vida pode oferecer. Quero os goles de felicidade em dose dupla, e que todos os mergulhos dados, a partir de hoje, sejam de cabeça, como deveriam ter sido nos dias em que o pé atrás me protegeu, mas, estranhamente, não me fez sorrir logo em seguida". - pensou, de vez.

Ela, então, levantou da cama. E com a máquina em mãos, foi respirar na varanda. Frio. Silêncio. E uma lua absurdamente linda e enorme iluminava com atitude o céu daquela noite. Olhou a máquina...por que não tentar? 

Mirou a lua, linda. Observou com cuidado a tela pequena. Concentrou-se. Sem tremer. E apertou o botão sem mais pensar. Segundos de processamento. E lá estava ela. A foto inteira. Nítida. Perfeita. 
Não havia sinais de ofuscamento. Era uma lua brilhante. Não mais turva, não mais escondida. 

Talvez fosse um novo começo. 
Uma nova chance de não deixar mais que as fotografias se ofusquem, e que a felicidade não fique nítida com há de ser.

domingo, 12 de junho de 2011

Deixe que digam

Ele: - Por que falam tanto? Olham tanto? Espiam tanto?
Ela: - Eu não sei o que veem na gente. Não sei dizer o que, em nós, tem a ver com os outros.
Ele: - Há algo de errado?
Ela: - No amor?

- Não, na gente.
- Mas nós somos amor.
- Ok, no amor, então. Há algo de errado?
- Não. Pra quem o vive, não. Mas pra quem observa, muitas coisas podem estar erradas. Por exemplo, essa sua cicatriz no supercílio...é de fato muito estranha. E, mesmo assim, conseguimos ficar juntos.

Ele riu.

- Eu falo sério.
Ela: - Eu também. Só estou tentando lhe dizer que o amor tem dessas coisas. Escolhe dois indivíduos e os faz enxergar coisas diferentes das que o resto das pessoas veem. Se, pra mim, seu rosto é perfeito, pra eles, sempre haverá essa cicatriz no supercílio.

- Mas por que se importam tanto conosco? Por que não nos esquecem e param de falar, de notar, de espiar?
- Em vez de pensar na sua reputação, pense em mim.
- Mas penso em você todos os dias.
- Me diz então o que falta mais.
- Não falta nada.
- Então fique tranquilo aqui na fortaleza. O amor nos colocou nesse estado de espírito, e nem o verbo na boca dos outros consegue ser maior que o nosso silêncio que diz tudo.
- O que você acha que eles estão vendo?
- Não sei, devem estar vendo um montão de coisa errada. E eu só vejo você.
- Eu só vejo você.

E saíram de mãos dadas. Entre olhares e vozes alheias.
Mas eles estavam cegos e mudos.
E absurdamente felizes.

domingo, 5 de junho de 2011

2º ato

Ir embora não é traumático como parece. O problema é que, olhando de dentro, parece que é o fim. Pode ser o fim da cena, da trilha, da página. Mas não é o fim do filme, do caminho, do livro. Continue assistindo, caminhando e virando páginas. E verá que ir embora é a forma que a vida encontra de te fazer dar passos. Os passos da vida não são os mesmos que você dá pra não perder o ônibus ou para atravessar a rua. Os passos da vida são maiores. Vêm em forma de mudança. Eles querem ser notados, querem mesmo é provocar. Às vezes eles se confundem com tropeços. Mas acredite, são sempre passos. Maiores, menores, que seja. Não deixe de andar pra frente. 
Ir embora de um lugar ou de alguém é permitir que o teatro da vida vá para o 2º ato. 
Sem comprometer os aplausos do final.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Visita

Era difícil entender. Difícil falar. Difícil, inclusive, escrever. 
"O amor está aqui" - confirmava ela, com toda a certeza que tinha em si.
Mal se encontravam pela vida (os dois, ela e o amor), mas dessa vez ela sabia que haviam se esbarrado.
Só que andavam se estranhando ultimamente.

Ela sempre abria a porta e um sorriso gigante toda vez que ele chegava. O problema é que ele ainda teima em vir de surpresa. E isso sempre desconcerta. Ela sempre leva um tombo, mal acostumada que é pra essas coisas. Mas logo se levanta, faz as pazes com o inquilino e vai viver bons momentos da vida. 

Mas dessa vez, não. A surpresa foi imensa, sim, como sempre. Só que a casa já estava cheia, com as outras surpresas que a vida lhe reservara. Tudo parte de uma fase eufórica que ela atravessava. Tudo parte da fase em que se sentir mais jovem era impossível. Em que a sensação de liberdade era um ímã. E ela, o metal.

Ela até sabia que o amor era raro em suas visitas. Por isso, tentou acolhê-lo. Tratou de apertar em algum cantinho. Mas ele sempre quer ser o rei. Quer sempre vir arrebatador, espaçoso e exige toda a atenção pra ele.
Dessa vez, não. Ela não podia (queria) se dedicar agora. Teve que ser dura, então, fazendo com que o amor desse meia-volta. Com as malas na mão, ele foi. Sem dizer quando voltava.

Só que ela sabia como era. Ele nunca ia embora de graça. Deixava sempre uma partezinha de si, pra fazer a menina pensar e pensar. Não esquecer, nem negar. Como se deixasse sempre uma brecha na porta, pra pegá-la de surpresa na próxima vez, já que ele não desiste fácil assim.

domingo, 8 de maio de 2011

Para ela

Começou com muita dor, um esforço de matar. Eu mal sabia o incômodo que causava pra ela naquela hora. Depois foram vindo sorrisos e orgulhos. Porque eu falei a primeira palavra. Porque dei o primeiro passo. Porque fui ao banheiro sozinha. Porque peguei certo no talher e aprendi a beber no copo. Porque a minha vida caminhava e, ainda que eu não soubesse disso, ela comemorava cada etapa por nós duas. 
E então aprendi a ser atrevida, a dizer não, a torcer o nariz e exigir do meu jeito. Ela, então, se esforçou pra me mostrar os limites, me colocar no eixo e me fez entender que muita coisa funciona do jeito que eu não quero. Foi aí que ela me ensinou a ser flexível e, graças a Deus, fez aquela manobra decisiva para que eu não entrasse no grupo do narizes empinados. Fez com que eu aprendesse a tomar doses de humildade, pois ela sabia o quão importante isso seria no futuro. 
Ela misturou sorriso, preocupação e curiosidade quando apareceu o primeiro namorado. Fez de tudo pra saber os detalhes e, ainda que eu cismasse que nem tudo era de sua conta, no fundo, no fundo, ela só queria que fosse alguém direito e que me desse o valor que só ela sabia que eu tinha. E, acima de tudo, ela me ensinou, nesse momento, a dar a mim mesma o devido valor. É o que ela chama de amor-próprio.
Depois, aprendi a negociar e, entrávamos então, em uma fase de longas discussões. Eu queria o piercing no nariz, o cabelo grande, a saia curta, a viagem com os amigos e chegar tarde em casa. Ela só não queria que eu tivesse alergias e nem me machucasse. E queria, acima de tudo, que eu chegasse viva em casa e soubesse que pra tudo há limites nessa vida. Mesmo quando temos 18 anos e achamos (com toda a certeza do mundo) que as limitações acabaram e que somos donos do tempo, da coragem e das possibilidades. 
E quando discordávamos demais, ela rezava pra que o desejo adolescente de nunca mais pisar em casa fosse logo embora.
Quando eu descobri que o amor pode doer, foi ela quem segurou nos ombros minha tristeza, minha decepção e indignação com a vida, amparando minha imaturidade no seu colo de experiência.
Um dia, então, eu aprendi que conquistas aparecem com o esforço. Quando entrei na medicina, ela multiplicou o meu sorriso e pegou um deles pra estampar na cara dela. Pegou minha felicidade e fez a dela ser igual, se não maior. Incorporou a sensação de dever cumprido, nova fase começando e toda a ansiedade adolescente que eu tinha em mim naquele momento. Fez isso porque merecia comemorar, como uma menina, todas as vezes em que ela não me deixou desistir, que abriu mão das viagens pra acompanhar minhas provas e que me fez ver que o estresse, às vezes, pode ser deixado de lado. 

Ela não me deixou na mão um minuto sequer.

E depois de passada a euforia da conquista, olhei pra frente e vi um novo mar de desafios. Muito maior que o anterior. Ela bem que tinha me dito que a vida é feita disso. De fases, de oportunidades e desafios a serem vencidos. Novamente eu me assustei. 

Mas logo senti a mão dela segurando a minha, me convidando de novo a dar aqueles passos dos quais ela tanto se orgulhou no início da minha vida. 
De novo me fiz criança. Desamparada e insegura. E de novo ela me deu a dose de confiança que eu tanto preciso. De novo, como nos meus primeiros dias de vida, ela me abraçou forte e me lembrou que está comigo.
E não abre mão disso por nada nesse mundo.

Te amo, mãe.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Pausa

E de tão boa que havia sido essa última fase, ela acabou esquecendo que a vida tem umas quedas repentinas. Tudo bem, o dia havia sido ruim e ela, sem querer, deixara a paciência cair em algum lugar pela rua. Pelo menos ela sabia que a tristeza não era apenas pelos detalhes indesejados do dia, mas havia recebido uma contribuição significativa de dias anteriores, que resolveram gritar só agora. Era assim que funcionava. Os problemas, no fundo, no fundo, reconhecem o quão inconvenientes são e procuram dar o ar da graça logo de uma vez só, pra que a dor não seja lenta. Podem ser antigos ou recentes, mas possuem a incrível capacidade de pegar um dia, escolhido a dedo, pra mexer com a sua cabeça. Fazem isso porque são experientes, e sabem que é melhor tirar o curativo com um único puxão do que ir pelas bordas, sentindo cada pontada de dor aguda, como se a ferida fosse 5 vezes pior do que realmente é.

Desculpe o fluxo de consciência, mas achei que você devesse saber disso.

Então, o dia estava chegando ao fim. Uma decepção ali, um atraso aqui, doses de preocupação, pessoas indesejáveis e pronto. Explodia a vontade de sumir um pouquinho, como há muito não aparecia. Queria começar pelas pessoas, dar um tempo de todas. Depois olhar pra dentro dela e ver o que tinha saído do eixo. E assim iria se acalmando. Mas das pessoas...sim, precisava de um tempo. Tinha essas crises de misantropia às vezes, que duravam pouquíssimo, mas tinham seu lado bom depois, ela sabia disso. Talvez estivesse sendo generalista, mas era mais fácil assim. Ninguém precisava saber, então, tudo ok. Logo, logo a paz voltaria. E com ela, a normalidade.
"Vá dormir. Pelo menos o dia acaba. Talvez 00:05 já seja um dia melhor."- disseram a ela. 
E talvez esse tenha sido o pedido mais racional para o momento.
Ela então deitou. Sentiu as costas agradecendo por isso. A cabeça então, respirou aliviada.
Os pensamentos, nessa hora, tentaram invadir a cabeça dela, como sempre fazem antes do sono profundo. E se sempre têm sucesso, hoje não o conseguiram. Estava proibido pensar em coisas naquela hora, quanto mais em pessoas. Deram meia volta, e foram habitar outras cabeças inquietas.

Para ela, o setor de pessoas e pensamentos estava temporariamente interditado. Coisa boba, parecia. Mas só ela sabia o quanto era necessário.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Panorâmico

Meu bem, sabe quando vamos viajar e, na hora da decolagem, vemos a cidade de se afastando lentamente? Naquela hora, de noite, em que os cansados já cochilaram, os leitores já se concentraram e você observa a cidade ficando pequena, lá embaixo. Existe um momento que quero lhe contar, nessa subida. É antes de as pessoas virarem pontos e de as primeiras nuvens começarem a passar pela janela. Existe uma hora, bem aí, em que a cidade da qual estamos saindo parece fazer todo o sentido. Lá de dentro, tudo é um caos, tudo é gigante e quase nada é do nosso controle. Mas nesse momento que estou lhe contando, dá para observar os quarteirões em perfeita simetria. Os espelhos d'água bem delimitados. E aquela minhoca de luzes vermelhas de faróis infinitos serpenteando entre os prédios, como se dançasse lentamente pela selva de pedra. Lá de cima, não ouvimos as buzinas impacientes, nem respiramos a fumaça constante. É tudo sereno, simétrico, sei lá. Podia haver uma trilha sonora e pronto. Faria tanto sentido a cena observada, seria de uma organização tamanha que o prazer e o alívio de vê-la atingiria até o mais estressado cidadão. 

Pois bem. É isso que estou fazendo agora. Olhando a gente lá de cima, do ponto perfeito onde tudo faz mais sentido, de tal modo que de dentro dos acontecimentos e da rotina, somos verdadeiros cegos, aflitos, sem entendimento. Quero olhar do alto, ter a vista panorâmica do nosso filme, da nossa novela. Tão linda que é. Mas ultimamente tem me convidado a fazer essa viagem, fugir um pouquinho pra pegar o melhor ângulo. Desvendar a minha cabeça como uma sagaz observadora. Que não perde um detalhe sequer da imagem que observa. 
E a imagem, meu amor, é a gente. 

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Movimento

Sempre que penso em liberdade, imagino coisas em movimento. Sim, a liberdade me remete à cinética. Não sei dizer ao certo por que essa ideia sempre perseguiu a minha cabeça. Espere, aí vai mais um indício. Viu? O movimento é tamanho que nem os pensamentos conseguem congelar 1 segundo aqui na cabeça para que eu possa explicar a você que diabos de ideia é essa de liberdade ser movimento. E que frase mais longa e sem pausas foi essa minha que mais parece que sai correndo antes que você possa terminar de ler. 

Já que não sei escrever o motivo pelo qual tenho tal imagem da liberdade, vou deixar que caiam aqui algumas cenas que me ajudem. 

Cabelo solto ao andar de bicicleta. Mão pra fora do carro na viagem da estrada. Correr pro mar pra furar uma onda. Rabiscar um papel branco até rasgar. Jogar balde de tinta na parede. Cantar alto quando toca a sua música. Banho de cachoeira. Um chute sem direção. Um pulo de pára-quedas. Rasgar blusas. Subir num impulso pra superfície depois de muito tempo prendendo o fôlego. Apostar corrida até a cozinha. Levantar a pessoa que você está abraçando. Andar pulando a parte preta do chão. Folhear um livro novo em 2 segundos e sentir o cheiro dele. E ter vontade de dançar no meio da rua a música que o mundo paralelo dos seus fones do iPod transmitem no volume máximo...

Liberdade cineticamente gostosa essa que tenho em mim.


sábado, 2 de abril de 2011

De dentro pra fora

Se pudesse, eu te encaixava no melhor lugar dos meus dias. No melhor horário, no pico do bom humor e com toda a atenção que você sempre mereceu. No meio da minha confusão da rotina e da cabeça, acabo perdendo em alguma caixa, mochila ou gaveta aquela saudade forte e constante que me fazia correr atrás de você não importava em que circunstâncias. Não entendo por que a distância se fez tão presente pra mim, de repente. O tempo continua aí, os dias têm a mesma quantidade de horas que sempre tiveram. E você...ah, meu bem. Você ainda é o mesmo, com seu carinho pontual, seu sorriso de ressaca, seu abraço confortante e sua atenção, que mais parece um mar de consideração. É um conjunto que me faz calar a boca. Que me faz agradecer em silêncio e concluir que qualquer insatisfação, nesse caso, teria a mesma lógica que há em chutar uma parede. 

Pois bem, o que me deixa tão inquieta no meio de tanta estabilidade? É melhor começar a procurar em mim, em vez de catar na paz externa o motivo da minha aflição. Em vez de procurar no dia ensolarado o motivo da minha chuva. Em vez de tentar entender minha seriedade olhando pros sorrisos lá fora. Vê como não tem sentido?  A grande verdade é que não parei pra ME pesquisar. Pra vasculhar AQUI dentro o que realmente está acontecendo. Esperei que as opções externas se esgotassem. Agora sobrei. Confesso que estava com medo de descobrir o que se passa aqui dentro. Vai que essa consciência tá sabendo mais do que eu? Geralmente ela fala coisas bem interessantes. Panoramas que esclarecem as ideias. Respostas que eu andava procurando há tempos. Então, eu paro de fugir. Me rendo a mim mesma. Tragam o espelho. Quero ver o que ele diz.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Restrito

Não me leve a mal. Mas é que vivo assim, em fases. E às vezes, quando você tenta se aproximar, tenta ocupar essa parte do território que é sua, tem uma coisa em mim que me chama pra mim mesma. Entendeu? Eu me chamando pra estar comigo. Isso pode parecer delirante e, de fato, mentalmente preocupante. Mas não, amor. É assim...às vezes eu me sinto a melhor pessoa ao meu redor pra estar junto. Conversar, deixar o tempo passar.  E assim passo longos minutos. Eu, e eu. E isso é quase um decreto de quem chama pelo meu nome, aqui dentro. Simplesmente, eu recuo. Prefiro silêncio. Paz. E nenhuma insistência até hoje conseguiu me trazer de volta dessas horas tão introspectivas, que sinto não saber lhe explicar por que existem. Só sei que o motivo não está em você, que tanto me impressiona e fascina a cada dia. Está em mim, oras. Mas veja bem, você continua tendo a chave de casa, a chave do meu sorriso, da minha fala e do meu carinho. Mas, estranhamente, nunca vai ter a chave de mim. Entende?

quinta-feira, 17 de março de 2011

Um cansaço bem vindo

É cansaço sim, mas é daquele bom. Conhece? Quando você se esforça, sua, respira ofegante mas, ainda assim, se sente estranhamente feliz. É cansaço de satisfação. Posso até falar em realização. E não venha me dizer que a pouca idade ainda não me permite entender o que é ser realizada, sentir-se completa. Já disse a você que a vida é  por etapas, e sim, é possível distinguir o gostinho de cada uma delas. No meio da correria que recomeça, sinto um ar novo. E degusto lentamente qualquer coisa que me faz sorrir junto com a fadiga. Algo parecido com alguém que degusta suado, cansado e com as pernas latejando após uma trilha de cinco horas, uma vista desejada. E um pôr-do-sol alucinante. Que se faz mais belo ainda pra quem subiu até lá pra ver. Só estando lá no alto pra entender. Só lá em cima é que o cansaço vira seu amigo, e você, ainda que destruído, pode abrir um sorriso só seu. Arduamente conseguido.

quarta-feira, 9 de março de 2011

Em nome da confusão

Em nome de todos os confusos deste mundo nada claro, eu peço que não se desesperem. Afinal, você que pensa ser íntegro mal sabe que as tuas partes estão em constante discussão. Há dias de paz na mesa redonda de mim, de você, de todos nós. Mas a confusão faz parte, e é para decifrar esse quebra-cabeça da gente que muitos de nós encontram força, coragem e, principalmente, ganham experiência (que diga-se de passagem, está aí para ser construída por você). Então, defendo os confusos. A confusão não é sinal de imaturidade, de burrice por não saber o que fazer, de falta de controle de si mesmo. Não. Esqueça. A confusão é simplesmente o terreno primordial pras tuas maiores conquistas, satisfações e realizações pessoais. Entende? Quando você pede coragem, ganha a oportunidade de ser corajoso. Quando pede determinação, ganha a oportunidade de ser determinado.  Ao pedir pra que as coisas dêem certo, você também ganhará a estrutura pra que isso aconteça, ganhará as ferramentas. E quero que entenda a confusão como parte do kit. Estar confuso significa que a parte que pensa brigou com a que sente que discutiu com a que age que expulsou a que espera que gritou com a que só olha. Mas veja, não é o fim do mundo. É só o pontapé inicial pra um novo ciclo de clareza que logo vem por aí. É por causa dela que os pensamentos vêm a tona, que são convidados para uma nova reunião em sua homenagem, que pede socorro. A confusão pode não ser bem-vinda pros aflitos, mas é ela que abre a porta pra calma voltar pro seu devido lugar.

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Fragilidade

O que quero escrever já passou. Digo, no tempo, não na cabeça. Geralmente venho aqui gritar quando a ferida ainda está aberta, pulsante, viva e fresca. Mas dessa vez a nova rotina só me deixou vir hoje. E como toda dorzinha, por menor que seja, deixa uma leve cicatriz, ainda vale mexer nela por aqui.
Um dia desses falei sobre gelo. Gelo interno, entende. Agora, abraçando a inconstância, quero falar de fragilidade. Porque resolveram tocar num espaço reservado, mexeram no calo que eu não sabia que carregava aqui comigo. E aí, meu amigo, a sensação estranha de repentinamente derramar água pelo olho é incontrolável. E eu, cheia de mim, achava que isso não era de lei. Mas é. Eu, você, todos eles têm um cantinho assim escondido, onde qualquer armadura vira pó. E a gente mantém a postura e fica de pé quando ninguém vem mexer onde não deve. Provocar o que não conhece. Explorar sentimentos dos quais não têm posse. São meus. Não venha testar. Não venha confundí-los, explorá-los mais do que o seu braço te permitiu alcançar. Muita coisa aqui não é sua. Então não me venha tentando acertar a senha desse cadeado. Cada erro, pra mim, é um golpe atrevido teu. Que veio apressado, mexer onde não deve. Que nem criança pequena, que sempre cai no chão quando tenta correr mais que as pernas.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Por algo a mais

De vez em quando ela se perguntava se não estava faltando algo. Alguma coisa parecia não ter preenchido seu devido lugar e agora deixava um vazio. Engraçado era que nunca parecia estar satisfeita. Sempre havia um detalhe faltando. Um ponto coçando. Interpretava a situação, concluindo que era uma amante de processos. 
Sim, deixe-me explicar. 
Ela amava a linha de chegada, mas preferia a corrida. Gostava do quadro pronto, mas o orgulho estava no movimento do pincel. Valorizava a medalha ganha, mas nada se comparava à emoção do jogo. Entende? Era uma garota de processos, meios, do "fazer", do andar das coisas e sua bela construção, muito mais do que o prédio todo erguido. Não significava que nunca visasse metas, resultados, finais felizes. Não, não era isso. Amava essas conquistas. Mas me refiro aqui a uma questão de preferência. Pois ela era inquieta, e se via na constante necessidade de estar buscando algo. E talvez fosse esse o problema de agora. Muita coisa se concluiu de uma vez só. Todo desejo realizado tomou posse de seu ponto final e a menina dos processos, buscas e procuras se viu estagnada. 
Mas não era essa a vida que pedira a Deus? Não eram essas as pessoas pelas quais rezou pra ter ao lado? Não era esse o orgulho que quis dar à familia e a ela mesma? E o gosto da vitória? Não era esse que tanto buscava em pratos desconhecidos por aí? 

"Pois bem" - ela dizia. "Pra continuar minha busca eterna, não preciso jogar fora todas essas coisas conseguidas. Guardo como amuletos, tesouros, relicário só meu. Guardo tudo. Mas me deixe continuar andando, como se ainda precisasse abraçar o mundo pra ser feliz."

E assim seguia. Buscando a mudança. O processo. A mutabilidade que, apesar de cansativa e cara, era o que a fazia se sentir produtiva; vencedora. 
E, acima de tudo, viva.


segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Pra você, um até logo

Faz um tempo que escrevo uma palavra, e apago. Escrevo uma ideia, e apago. Uma letra, e apago. Exatamente como você me deixou desde quando nos conhecemos. Sem palavras. Não sou de falar muito quando estou com você. Mas sou de rir bastante, e de aproveitar o teu sorriso até o último minuto. Mexer no teu cabelo até a última ponta. Curtir o teu abraço até o último aperto. E hoje eu curti o teu rosto até a última foto que meus olhos puderam tirar. Essas coisas, minha amiga, não chamamos de despedida. Eu chamo de um até logo. Até breve. Volte sempre. A gente se vê. E por aí vai. "Obrigada", você disse. Enquanto eu, internamente, agradecia eufórica simplesmente pela sua presença no meu abraço. "Os meus olhos só ficam vermelhos quando todo mundo sai da frente". Eu e minha mania de adiar essa singela manifestação de agonia do corpo, sempre. Como se isso me fizesse mais forte. Pois te digo que foi só fechar a porta para aqueles riozinhos vermelhos dos olhos transbordarem rosto abaixo. E dentro de mim, você já havia deixado marca. E começo a suspeitar que desde que nos conhecemos, você não parou de marcar minha vida com as surpresas que trouxe pra mim.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Gelo

Tudo bem, nada de pânico. Chegou o dia de você ir embora. E em breve estarei chegando aí. Coisa pouca, logo passa. O problema é que tenho sempre esses momentos de ficar me achando estranha, sendo a maioria deles quando você se afasta. E quando cavo aqui dentro pra saber o que diabos me ocorre, sempre acho a mesma resposta boba que qualquer um consideraria uma grande besteira: penso ter uma peça fora do lugar simplesmente pelo fato de estar sentindo qualquer coisa que seja com uma intensidade que não esperava. Tem gente que chama essas coisas pelo bom e velho nome de 'amor'. O rei das generalizações do mundo moderno. Outros amenizam pra 'carinho'. Eu restrinjo o foco pra 'saudade'. E assim vou procurando saber o nome dessas coisas que invadem o portão de mim, que tranquei a sete chaves. Tem senha de 4 dígitos e reconhecimento da digital. O problema foi não prever que você poderia achar um outro caminho sequer por aqui. Algum lugarzinho vulnerável e desprotegido, ainda não calejado pelos truques dessa vida. Não que a experiência seja grande nesses meus áureos e abençoadíssimos 18 anos, mas deixem-me falar até onde o tempo me permitiu alcançar então. 
Agora o cadeado já está quebrado, a senha decifrada com sucesso e você ainda brincou deixando tua digital marcada aqui na pele. Burlou o sistema, as regras de mim, quebrou os padrões e sorriu pra que eu amolecesse de vez. E no início eu me preocupei. Me preocupei com o espaço que estava sendo tomado tão rápido. Um intruso completo. E me permita dizer que, agora, a preocupação foi pro final da fila das sensações que você vem provocando. Sabe-se lá porque ela está sempre me acompanhando. Não leve a mal. É que eu sempre tive um gelo que faz parte de mim. Gelo dentro, assim. Entende? Uma camada sólida. Gelada. Gelada. Gelada. 

E, sinceramente, desde o dia em que você apareceu, não consigo imaginar para que ela me serve.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Por outro ângulo

E ela estava amando essa história de o verão ser mais intenso esse ano. Ter mais sol. Mais sorriso. Risada de doer a barriga. Ter pôr-do-sol mais bonito. Vento mais gostoso. Bronzeado mais fácil. Cerveja mais gelada. E principalmente, pensava ela, gente mais interessante. Não era lá muito sociável, muito comunicativa, extrovertida e essas coisas. Mas esse ano, era ela quem buscava conhecer. Conhecer gente e, acima de tudo, conhecer a menina que havia dentro dela. E que há muito não dava o ar da graça por ali.
Nessas horas, em que tudo parecia mais, mais e mais, a consciência logo tratava de explicar.

"O sol não ficou mais forte. Nem o vento mais gostoso. Nem o verão é mais verão. O que existe, na verdade, meu bem, é você abrindo os olhos de um jeito diferente. Quando a gente muda, o mundo muda com a gente. E aí está você. Com o mesmo vento. Com o mesmo sol. Só que mais livre. Mais leve. Mais feliz".

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Boas vindas

Sim, eu sei que a saudade aperta quando a gente tá longe. Eu conheço a saudade. Nós já conversamos...já até perguntei a ela se não podia aliviar a barra às vezes. Mas ela, esperta como sempre foi, se disse essencial, e falou ainda que apesar de devastadora, é ela que mantém de pé esses amores que de vez em quando tropeçam por aí. Mas você, meu bem, não tem me deixado muito ser amiga da saudade de uns tempos pra cá. Você fez ela crescer tanto que me deixou pequenininha com minha máscara de resistente-e-imune-a-essas-sensibilidades-e-frescuras e me fez sentir sua falta como uma criança sente falta dos pais quando viajam, do cobertor especial, da bagunça na cama dos pais e dessas coisas mil que constroem nossa vida. Mas, não somos crianças, meu amor. Sei que logo você chega. E quando eu te encontrar, a saudade trata de te explicar também que diabos ela estava tramando esse tempo todo. Afinal, dois ímãs deixam de se atrair quando se aproximam depois que um longo afastamento? Que nada. 
A Paraíba tem amanhecido com cada sol, que você não imagina. 
Mas perde pro verão no meu sorriso. Só esperando você chegar aqui.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Boa viagem

Esse ano ela havia prometido que acertaria na mala. Tudo bem, ela não era boba. Sabia que o excesso de roupas sempre existiria. Sabia que voltar para casa com blusas intactas era um fato que se repetia a cada ano. E sabia que não era hoje que entraria no mundo das estranhas criaturas compactas e econômicas em suas bagagens. Não era aos panos que se referia. O que havia sabiamente prometido era que deixaria em casa a sacola dos problemas. Todos os anos, essa inconveniente bagagem de mão acompanhava a sua viagem pro paraíso, não cabia no compartimento da aeronave (o que causava um desconforto nas pernas durante todo o vôo) e, estranhamente, rasgava uma das alças durante o desembarque. Era assim, e não se sabia explicar o motivo. Talvez o próprio conteúdo da sacola já falasse por si só. Esse ano, então, seria diferente. Não foi um decreto. Não foi um esforço. Foi a pura e espontânea felicidade que havia tratado de aposentar os problemas. Esse ano era dela. Essa criatura (sim, a felicidade) não anda por aí em qualquer esquina, mas, quando resolveu dar o ar da graça, chegou em onda. Com uma força e elegância inimagináveis. Tomou as rédeas da vida da menina cansada e séria e dominou, num piscar de olhos, o mais incrível turbilhão de boas energias, boas sensações e bons momentos que agora caíam do céu como chuva forte e refrescante. Ela tinha esse poder, a felicidade. O sorriso da menina de olhos castanhos passou a não mais caber no rosto, e então ela agora distribuía por aí. " É verão" , dizia ela. " É verão no Rio de Janeiro. Mas é verão em mim também". E em alguns momentos, quando chegava na paz de sua casa, ela largava a bolsa no quarto, olhava para a felicidade em pé, ali na sua frente, e logo dava um abraço, sem saber como poderia demonstrar estar tão grata. E brindavam juntas, com cerveja bem gelada, essa coisa intangível e imprevisível que carinhosamente chamavam de vida.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Pra não doer demais

Existem pessoas que simplesmente estão de passagem. Você pode sentir saudade. Querer que volte. Que o filme se repita. Mas não sabe que elas entraram na sua vida para realizarem a dolorosa função de saírem dela um dia. Aqui no meu desabafo ninguém morreu não. Ninguém desapareceu, nem deixou de existir. É gente que continua existindo depois sair pela porta dos fundos. Mas algum dia, não se sabe por que nem muito bem a partir de quando, a pessoa foi a peça perfeita no quebra-cabeça da sua vida. Mas, sendo a vida um processo, uma coisa fluida, mutável, inconstante e absolutamente imprevisível, deixe-me revelar a você que todas as peças mudam de forma nesse jogo. E simplesmente um dia você acorda sem encontrar o encaixe perfeito que existia anteriormente. E aí parece que fica um buraco. Parece que a coisa desanda. Mas é só a vida te cobrando um tempo pra que tudo se ajeite novamente. Então outra peça toma o lugar da antiga. Trazendo a harmonia que você tanto se esforça pra ter consigo, sempre. Mas que graça haveria se todos os encaixes de gente na tua vida fossem perfeitos? Graça nenhuma, eu te digo. A dor da despedida não é pior que a dor silenciosa da rotina. É melhor tirar o curativo de uma vez só, do que puxá-lo lentamente, ponta por ponta, e você já está cansado de saber. Toda pessoa incrível que sai de nossas vidas do dia pra noite, toda peça que muda de forma pra você é um curativo puxado em 1 segundo. Quando você tenta remoer o ocorrido, tenta voltar, se martiriza forçando um contato que já não existe mais, que já não faz mais sentido a não ser na ilusão que você mesmo constrói por medo de enfrentar a coisa de cara, quando age desse jeito, está puxando o curativo da forma mais lenta que pode. Mais dolorosa. E sem assoprar.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Aos editores

Imagino como deve ser a vida desses cronistas de jornais e revistas de renome. O prazer de escrever; de correr com a ponta do lápis linha por linha em um papel de rascunho qualquer; de apressar o passo atrás das letras quando elas começam a caminhar com pernas próprias, termina industrializado. O texto tem que sair. O prazo tem que ser cumprido. Os leitores estão esperando, e tempo, desde que você nasceu, é dinheiro!Não...palavras são dinheiro. Mas então, eu acredito que esses escritores devam ter um momento a sós com seus rascunhos. Porque não há coração que segure tanta artificialidade quando o que mais se precisa é de um bom e espontâneo desabafo em rabiscos. Palavras tão gritantes que parecem caladinhas quando deitam no papel. E a tua dor? Logo se cala também. Ainda que provisoriamente. Sim, eles têm desses momentos. Se trancam no banheiro e em vez de pegarem a gilete para maltratar os pulsos, em vez  de colocarem a escova de dentes na garganta- como uma adolescente de corpo perfeito- ou em vez de jogarem água gelada na nuca pra passar a ressaca, eles param. Sentam. Pegam dramaticamente um pedaço de lápis ou qualquer coisa que escreva. Um papel amassado do bolso. E se deleitam com os riscos. E o prazer não se descreve nessa hora. É a dose de palavras que pediram o dia todo. Como a dose de uísque que pede o alcóolatra em crise. É a dose de expressão que aquela dorzinha aguda lá do fundo pedia para ter. Discreta, mas torturante. E, acima de tudo, humilde. Porque não queria mil olhos lendo a sua versão escrita. Não queria os holofotes que recebia do segundo caderno do jornal. Da sessão especial da revista. Só queria estar ali, com seu fiel dono em desespero. Pura, simples, escrita, sincera, rápida e espontânea. Ufa. Desculpe. Achei que devesse saber disso.