Você já teve a sensação de não poder ter algo que muito quer? Eu não falo de fracasso, muito menos de incapacidade. Hoje piso nessas palavras como já pisaram um dia em mim. Mas, deixe-me explicar o que martela a minha cabeça há alguns dias.
Apelo para o brega pois hoje estou com dificuldades de me expressar. Quando criança, eu gostava de montar quebra-cabeças. Cada vez maiores, 500 peças, requeriam um tempo enorme que testava minha paciência sempre curta. Então, quando já estava cansada, eu pegava uma peça muito parecida com o espaço que queria preencher da figura e tentava encaixar. Não era ali, mas eu virava, desvirava e pressionava a peça em vão, claramente percebendo que insistia no erro, ignorando que caíra numa extrema semelhança, mas ainda não no ponto certo. Desistia então, deixando de lado a peça amassada. Ficava um tempo olhando o resto do jogo. Engraçado como nessa hora era bom contemplar o que já havia sido feito. Eu descansava fitando meu trabalho (porque pra mim era uma obra dos deuses) e logo me dispunha a catar pecinhas certas no mar que ainda faltava pra completar a imagem. Esquecia a atitude boba de 5 minutos atrás e o jogo voltava a me entreter, botando fim na raiva e fazendo as pazes comigo. Enfim, peça errada não encaixa não importa o quanto tente, o quanto se esforce. Porque o motivo do não-encaixe não é a tua falta de perseverança ou a tua incapacidade de realizar aquilo. O motivo do não-encaixe é da natureza da coisa em si, é do formato do que você tenta manipular, sem aceitar que aquilo, simplesmente, não foi feito pra estar ali.
Eu hoje, então, me refiro a peças vivas. Sabe qual é a diferença? A coisa não pode ser sua não pela natureza própria ou pela forma como foi "fabricada". Mas sim porque peça viva, meu amigo, é possuidora de liberdade. E como tal, decide o que bem quer. É claro que tem vezes que você cai inesperadamente onde não escolheu. Pode ser bom ou ruim, pode ser no amor, ou na sorte. Mas cabe a você, sempre (sempre), resistir ou não a isso. Sair correndo ou não. A pecinha viva que você tanto quer colocar em um lugar (que parece ser tão certo na sua vida) decide se quer ir ou não. Ela ouve (ou não) os teus anseios, tua vontade e pega a parte das regras que você não alcança e decreta fim ou vida àquilo que está em jogo.
E aí, o que se faz é entender uma coisa que ontem veio bater na minha cabeça. Entender que é preciso valorizar o esforço, a vontade e até aqueles mergulhos de cabeça que a vida te convida a dar de vez em quando. Mas, lembrar também que uma parte ínfima dessa sede boa de tentar matar simplesmente não depende de você. No início é difícil aceitar. Dá vontade de tentar encaixar peça a todo custo. Aprisioná-la e gritar com toda força um quemmandaaquisoueu. Mostrar em luzes neon o tamanho da tua vontade e o desgaste do teu esforço.
Mas no fim, você para. Respira. Olha o suor. Ouve um risinho da peça que você tanto correu atrás. Então, devolve um sorriso cansado. Permita que seja orgulhoso também!
Aí, um dia desses, eu vivi um daqueles dias meus de criança socando a peça do quebra-cabeça no lugar que eu queria, com a garganta já salgada de choro. Então, subi as escadas de um lugar que pouco visito em mim. Onde eu posso assistir minha vida do alto de um mirante, e dar aquele sorriso sereno ao ver a parte da imagem que já está completa. Porque não dá pra ver do lugar onde acontece minha rotina. Eu aplaudi como os cariocas que aplaudem o pôr-do-sol. Larguei, lá de cima, a peça que tanto insisti pra ser minha. Ela não caiu pra fora da vida. Caiu no mar das que faltavam. E sabe? Ela, que um dia já foi tão especial, pareceu tão igual às outras ali no meio! Logo perdi de vista meu amuleto. Sentei, lá no alto, pra olhar um pouquinho as partes de mim lá embaixo. Inspirando cada dose boa de vento. Sentindo sol laranja de fim de tarde clareando a íris castanha. Sentindo também que o jogo, depois de tanto tempo, voltava a me entreter. Vontade de saber se a peça seguinte é do meu domínio. Ou se, de novo, vai me desafiar a convencê-la a ficar mais um pouco. Pra mais um café na minha sala. Eu deixo ela correr se quiser. Entrego a chave da algema. Ou abraço com toda força se ela aceitar o meu convite.
Coisa boa é acessar a visão panorâmica de emergência da vida (porque o bom é a surpresa, sem poder olhar o todo lá de cima). Coisa boa é sentir a leveza de, de novo, ir buscar o encaixe perfeito entre os pedaços de mim.
É, infelizmente eu sei o que é isso ... a questão é que você soube jogar sua peça fora, sorte sua. Grande texto, metaforicamente E literalmente haha.
ResponderExcluirBeijos, Lênin.
Acho que conheço esse título...
ResponderExcluirhttp://www.orkut.com.br/Main#Album?uid=13984515689890614564&aid=1
Lara
Leeeera
ResponderExcluirnao posso acessar o orkut porque deletei
mas o título dessa postagem é uma legenda de um álbum do seu profile.