Sete dias sonolentos, quentes e preenchidos por muito rosto, beijo e abraço. Sete dias em que fui amada, acolhida, perguntada e informada sobre como andam as coisas aqui. Sete dias, também, em que a cabeça não para e deitar pra descansar o corpo está longe de significar também o descanso da mente.
Me disseram que lá eu não tinha "vida real". Mas o problema é que poucos sabem que a vida real pode ser assim prazerosa, boa, justa, limpa e excitante. Não é preciso estar sonhando para se ter uma experiência boa e eu te garanto que meus olhos estavam abertos e alertas do início ao fim. Nem o discurso do "dinheiro garantido todo mês" serve para deslegitimar o que eu sinto agora, pois pra quem se entregou a todas as experiências possíveis, a realidade acontecia todo dia lá. Eu escolhi não fugir dela (sim, podíamos escolher fugir e sonhar o tempo todo se quiséssemos).
Sinto falta das manhãs, pois aprendi a acordar cedo pelo simples fato de entender, pela primeira vez, que dormir demais é, de fato, perder parte das surpresas boas do dia. E, nessas manhãs, sinto falta da casa já acordada, do café que combinávamos, do violão que tantas vezes me avisava que era hora de começar o dia. Sinto saudade de pegar a bicicleta e ir pra faculdade. E, ao chegar lá, me faz falta ter aquele mundo de facilidades à minha volta. Deitar na grama no intervalo ou chegar de madrugada na biblioteca: eu podia usufruir do que eu quisesse. Sinto falta de considerar a universidade um lugar aprazível, e não um antro de problemas. Não contava as horas pra ir embora porque eu não tinha pressa de nada. Não tinha protesto marcado, nem nada que me trouxesse uma tensão diária extra. Sinto saudade da gentileza nas ruas, no trem, no bar, no ônibus. Obrigada, licença, desculpa e bom dia eram essenciais no vocabulário. Me faz falta também a paz ao se andar pelas ruas. Sinto falta da liberdade que eu tinha. Poder usar a roupa que eu quisesse e andar pra onde eu quisesse sem ter de lidar com olhares estranhos, comentários inapropriados ou qualquer tensão nos ombros.
Sinto falta das pessoas que fizeram o lugar ter mais vida. Que caminhavam comigo e seguravam a barra se algum dia eu tropeçasse sem querer. Sinto falta da praticidade pra encontrar alguém, pra resolver alguma coisa ou pra ir de um canto a outro em duas rodas.
Eu era a pessoa mais feliz que eu já conheci. E eu tinha o sorriso mais bonito que eu já vi. Eu fui também a mais livre e adorei conhecer o quão grande posso ser em tantas situações.
Em sete dias, eu não posso dizer que saí do melhor e vim pro pior lugar possível. Mas acho que, na verdade, eu mesma me tornei um lugar hostil, assim, num piscar de olhos. Sim, o nosso estar no mundo é influenciado pelo que está ao redor e, às vezes, a armadura quebra e deixa a sujeira de fora manchar um pouco o interior.
Mas eu não preciso me preocupar. Descobri, depois desse longo encontro comigo, que a nossa essência às vezes perde o voo e só chega depois. Eu lembro o quão atrasada ela estava quando eu cheguei por lá. Então, agora que eu vim de volta, por enquanto me sinto só um corpo sem nada preenchendo por dentro, pois as outras partes estão por vir. Eu não esqueci lá, pois só o mais estúpido ser humano deixaria isso pra trás. Eu sei que está vindo, mas a viagem é mais longa. Talvez demore semanas. Meses. Não sei.
E de novo, eu vou ser a pessoa mais feliz que eu conheço. Com o sorriso mais aberto. Livre também. E em paz. Vai chegar esse dia. Vai chegar. Vai chegar. Vai chegar.