Andava distraída de mim e atenta às ruas do Jardim Botânico. O início de uma noite quente fazia a cidade fervilhar inteira e explodir em sons, luzes e cheiros. Eu andava rumo à charmosa rua onde tanto desejei morar e que, se eu pudesse, não visitaria assim, tão emotiva, suada e atônita naquele momento específico. Eu suava nas costas, axilas, virilhas e debaixo dos seios, mas seguia a passos largos sem me incomodar com o desconforto do calo do pé. Apenas andava e vivia o calor. Andar e viver o calor era fazer mais por mim do que os últimos 15 dias juntos e somados. Tudo é o que é e o meu destino na noite quente era andar, suar, roçar e sentir o calor. As baratas afoitas na rua também se apressavam em noites quentes. Seguiam funcionando - não sei se suadas - em movimentos determinados, certeiros e rápidos. Tão urbanas e subestimadas, as baratas me mostravam que mover-se era uma regra. Pensei no movimento que o calor traz a despeito de seu muito desconforto. Pensei nas aulas de física da adolescência, onde me contavam que as coisas maciças são todas moléculas em movimento que, quando aquecidas, se enlouquecem ainda mais. Pensei no absurdo que era constatar que uma coisa assim inteira, bonita e potente só é o que é porque se move toda sem ninguém ver. O resultado final está ali a olho nu, mas o trabalho molecular - o movimento quente das moléculas se chocando - este, ninguém vê. O movimento; o ir e vir; ah, como era essencial à vida!
Tudo isso pensei suada ao caminhar pela rua Jardim Botânico. Olhei pros meus pés quase chegando no destino e depois foquei no coração a 112 batidas por minuto, aflito e trabalhador. Sequei o suor do rosto. Senti a brisa quente da cidade em erupção. Me sentia desconfortável por dentro e por fora. Calma - eu mesma disse - o que é hoje pode não ser amanhã. Senti as moleculinhas da alma todas aquecidas; em movimento constante e cíclico no calor do momento, sem se importar se eu estava bem ou não. Apenas seguiam. A vida toda se move sem se importar com nada. O desconforto, coitado, não resiste ao movimento. Calma, TUDO se move.
Segui.