sábado, 19 de abril de 2014

Mar

Dentro d'água, no fim de tarde dessa sexta-feira azul, parecíamos crianças quando soltas em um parque. Enquanto você mantinha a atenção nas ondas brutas e os pés firmes no chão, eu já havia me desprendido dali e a cabeça voava longe, como era de praxe acontecer, deixando sempre um sorriso bobo no rosto pra servir de interface com o mundo que acontecia sem se dar conta da minha pausa.
Eu pensava, naquele momento, como o mar agitado que aproveitávamos diferia das águas calmas que eu levava na alma. Dentro de mim, eu carregava um mar sereno e tranquilo, enquanto o corpo sacolejava na espuma salgada e gélida. Fosse uns dias atrás, a bagunça daquele mar traduziria nada menos que o meu interior sem rumo algum. Mas agora não. A tempestade recente começava a dar lugar ao sol e a algum cenário que acaricia a vista de tão bonito que é. 

Paz nas águas. Era assim que eu me sentia. Um mar calmo era o que eu aproveitava com você agora. Paz sem tédio, sabe? Sem querer sair do barco e sem aguardar ansiosamente um grande evento inesperado. Paz sem tédio...nem lembrava mais como podia ser possível.

terça-feira, 1 de abril de 2014

Sem óculos


Sentada à mesa, de costas pra vista bonita do Rio, eu falava pelas tabelas enquanto matava a fome, já dolorosa, dessa tarde-surpresa de segunda. Punha os óculos de lado, como sempre fazia durante as refeições e, uma vez retirados, todo o entorno se fazia embaçado: 

"Só vejo você, não vejo mais ninguém!" - eu dizia. E ríamos do duplo sentido que essa fala já adquiria, sem querer. 

Quando você se encostava na cadeira, ouvindo meu papo não muito agradável, eu dizia não te enxergar mais, dado a distância agora aumentada. Então você ria -como costuma fazer sem esforço- e vinha pra perto novamente, brincando de ir e voltar como criança, que acha nas coisas da rotina um motivo pra ser feliz.

Depois, andávamos alegres, sem muito compromisso assim de imediato. Na minha cabeça, eu desejava, pros dias que se seguissem, poder andar sem óculos por aí, pra que todo o entorno parasse de existir quando eu bem quisesse. Cega pros olhos do mundo, pros rostos do mundo e pras coisas do mundo, eu desejava, por alguns momentos dos meus próximos dias, esquecer os óculos e só conseguir ver aquilo que, de tão pertinho e tão nítido, eu possa abraçar e chamar de meu.