É pela felicidade que levantamos todos os dias, ainda com sede de sono, e entramos mecanicamente no banho. E tomamos mecanicamente o café. E pegamos mecanicamente o trânsito. É para sermos felizes que abrimos o livro contra a vontade; que apresentamos o trabalho; que enviamos o relatório e cumprimos os prazos de uma agenda cheia. É pela felicidade que sofremos por amor, que mergulhamos na incerteza e nos entregamos a outrem sem saber muito bem o que farão da gente. É pra sorrir um pouquinho que obedecemos os pais, que abrimos mão do que queremos às vezes em prol de algo maior e ainda desconhecido.
A felicidade almejada é a força motriz dos dias de cão, dos dias de luta, da perseverança apesar das dores nas pernas, do frio na barriga de medo e das olheiras de sono.
Acontece que a felicidade gosta de se revelar só depois de um longo tempo testando o caçador de sorrisos. A história de busca por ela é um mar de contradição. É aquilo que nos faz questionar o-que-é-que-estou-fazendo-aqui; é uma sucessão de coisas que significam TUDO, menos ser feliz de verdade.
No fim, no dia em que a felicidade resolve dar o ar da graça, temos um tempinho muito menor com ela do que gastamos buscando-a. É como se ela fosse fugaz. Parece que tem que sair logo correndo porque a demanda no mundo é grande.
E o estranho é que vale a pena mesmo assim. E logo recomeçamos um novo trajeto, só pra sentir de novo o gosto efêmero, mas intenso, da recompensa em nossas vidas. Sentir o abraço que a felicidade dá quando vem nos cumprimentar. Enxugar o suor. Nos botar pra dormir tranquilos. Invadir a alma e recuperar em nós o gosto pela vida. Dar uma carga de energia no corpo quase morto.
É por esse momento incomparável de comemoração nossa com a gente mesmo que vale a pena dar tiro no escuro todo dia. Que vale a pena se jogar de corpo e alma e esperar ansiosamente por aquilo que não vemos, mas que chega.
Sempre chega.