segunda-feira, 15 de junho de 2015

Mar de gente

Eu pensei que o meu primeiro texto na Austrália fosse ser sobre o lugar. Juro que me vi fazendo um diário de viagem e postando coisas do tipo "Semana 1: viagem pra tal lugar". Mas não. Em vez disso, resolvi escrever sobre as pessoas que, bem ou mal, também contribuem para a minha impressão daqui e que, por muitas vezes, me fizeram enxergar beleza onde não havia paisagem nenhuma.

Olho pros dias passados aqui e, quando revisito essas memórias gostosas e fresquinhas, percebo que grande parte delas são compostas por rostos. Um leque grande de pessoas que passaram pela vida que comecei aqui e talvez nem saibam que deixaram uma coisa qualquer comigo. Rostos que só vi uma vez e me renderam boas risadas e uma aula de cultura local. Gente que repetiu pacientemente 20 vezes as instruções no futebol, durante o breve período em que participei. Gente que eu não gostei de morar junto e, por isso, me ensinou a ter paciência. Gente que não se importou se eu era filha mesmo ou não, e me tratou como tal no dia em que mais me senti vulnerável na vida e em que a dor aguda se misturou com o medo de estar sozinha. Nesse dia, também ganhei irmãs-por-um-dia e, no meio das lágrimas, eu consegui sorrir por dentro. Foi então que, estranhamente, depois da semana mais difícil, limitada e conturbada, eu senti o claro contraste da perna fraca com o espírito forte como nunca. Também houve rostos brasileiros, que nunca me pareceram tão reconfortantes como aqui. Teve gente que fez surpresa no aniversário e me fez sentir o calor de família daqui de tão longe. Gente que me fez lembrar que amor não fala inglês nem português. Gente que em meio a cigarros e uma vida de excessos, parou um pouco pra me dar um carinho e atenção sem precedentes. Que não mediu esforços pra fazer eu me sentir a pessoa mais cuidada dessa vida. Gente lá do início que sempre brota pra saber as novidades. Gente que tá sempre keen for a coffee. Gente que é tão australiano que eu não entendo uma palavra do que diz. Gente que é tão south american que capta a mensagem antes de eu terminar a frase. Gente que me leva pra um bom filme. E gente que eu chego em casa, cansada de um dia incrível ou mesmo só um dia comum, e fico imensamente feliz de encontrar.

Esse mar de gente, no qual ainda mergulho, me faz acreditar que os presentes da Austrália possuem nome, sobrenome e carregam, muitos deles, um sorriso impossível de esquecer.